16.11.12

"Questões sociais" entre personalidades pré-modernistas

"... a era, que se abre, é a era da questão social, o maior problema com que a humanidade jamais se mediu."
[Rui Barbosa, 1896]

Rui Barbosa é um dos expoentes da vida cultural e política brasileira do final do século XIX, assim como dos primeiros anos do XX, e atuou no campo das questões sociais com sua oratória juridicamente erudita. Euclides da Cunha também tinha o vício da oratória, mas seu empenho obsessivo em compreender a realidade brasileira, com as muitas contradições que marcam nossa formação social, fez dele personagem fundamental para conhecermos hoje a atuação de intelectuais nos debates acerca da questão social. Aliás, "Questões sociais" é um dos títulos com que Euclides inicia sua colaboração na imprensa brasileira, série de artigos assinados com pseudônimo Proudhon (ao lado de outra série de artigos sugestivamente intitulada "Atos e palavras").
Mas o que me traz ao picadeiro hoje é a reflexão a partir de um trecho de Silvio Rabelo sobre a personalidade de Euclides da Cunha, trecho que diz o seguinte:

"Uma noite estava ele com um amigo à entrada de um Cassino. Enquanto o amigo, despreocupadamente, se entregava ao prazer da música e à contemplação dos pares que dançavam, Euclides caiu em profunda tristeza, ao ver, não o baile, mas a massa esfarrapada, sublimemente asquerosa da multidão que, imóvel ao relento, queda-se ante aquele espetáculo que era uma gargalhada horrível, irônica à sua fome, à sua nudez."

O trecho é citado por Nelson Werneck Sodré em sua "Revisão de Euclides da Cunha" e sugere sugestivamente alguns delineamentos da personalidade originalíssima do autor de Os Sertões. Por ele podemos ter uma ideia das contradições que angustiavam intelectuais engajados nas ditas "questões sociais", que chegam mesmo à poesia purulenta de Augusto dos Anjos; o soneto "O Lázaro da Pátria", que retrata não uma "massa de esfarrapados", mas um "Filho podre de antigos Goitacases", é um exemplo da temática social na poesia excêntrica do poeta paraibano. Vale o cruzamento dos textos para uma definição ampla do momento pré-modernista. Até já.

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