24.4.13

Terra Bárbara, de Jáder de Cravalho


Trancrevo abaixo os versos de "Terra Bárbara", poema de Jáder de Carvalho. Antes porém seguem algumas rápidas considerações de Sânzio de Azevedo sobre o poema, recortadas do seu livro Literatura Cearense (1976). Este manual do professor Sânzio, imprescindível para quem pretende melhor conhecer o desenvolvimento da produção literária no Ceará, é atualmente livro raríssimo, mas pode ser acessado através do sítio da Academia Cearense de Letras, que disponibiliza aliás um vasto e precioso acervo digital, no seguinte endereço: http://www.ceara.pro.br/acl/revistas/index_revistas.html. O poema de Jáder de Barbalho e as considerações de Sânzio de Azevedo sobre o mesmo encontram-se no início do capítulo dedicado ao modernismo. Boa leitura.

Serra do Estêvão - local onde nasceu Jáder de Carvalho (foto retirada de http://sertaopoesia.blogspot.com.br/p/fotos.html)

"[...] Mas é em 'Terra Bárbara' que vamos encontrar toda a força do seu estro; aqui, misturam-se o poeta e o sociólogo, para nos dar um dos maiores poemas que o sertão e o seu povo já inspiraram a alguém: ao compor seus versos livres o poeta não desdenhou alguns versos livres que surgiram espontaneamente, e assim temos, ao longo do poema, alguns decassílabos (como o destino do seu povo errante; bate sem susto no primeiro pouso, etc.), tendo doze sílabas o verso final: como antes te acordava ao choro da viola. Trata-se do verdadeiro verso livre preconizado por Mário de Andrade: nem escravização à medida nem à antimedida. [...]" (Azevedo, Sânzio de. Literatura Cearense. Fortaleza: Academia Cearense de Letras, 1976).


    


Terra Bárbara


Na minha terra,
as estradas são tortuosas e tristes
como o destino de seu povo errante.
Viajor, 
se ardes em sede, 
se acaso a noite te alcançou, 
bate sem susto no primeiro pouso:
— terás água fresca para sua sede,
— rede cheirosa e branca para o teu sono.
  
Na minha terra,
o cangaceiro é leal e valente:
jura que vai matar e mata.
Jura que morre por alguém — e morre.
 (Brasil, onde mais energia:
na água, que tem num só destino
do teu Salto das Sete Quedas
ou na vida, que tem mil destinos, 
do teu jagunço aventureiro e nômade?)
Ah, eu sou da terra do seringueiro,
— o intruso
que foi surpreender a puberdade da Amazônia.
 
Eu sou da terra onde o homem, seminu, 
planta de sol a sol o algodão para vestir o Brasil.
Eu nasci nos tabuleiros mansos de Quixadá
e fui crescer nos canaviais do Cariri,
entre caboclos belicosos e ágeis.
 
Filho de gleba, fruto em sazão ao sol dos trópicos, 
eu sou o índice do meu povo:
se o homem é bom — eu o respeito.
Se gosta de mim — morro por ele.
Se, porque é forte, entender de humilhar-me, 
— ai, sertão!
Eu viveria o teu drama selvagem,
eu te acordaria ao tropel do meu cavalo errante,
como antes te acordava ao choro da viola...

                                                                                                                           
Jáder de Carvalho

3 comentários:

joana disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
joana disse...

Estudando os textos recomendados professor encontrei esse poema.
Por sinal muito sugestivo aos ultimos dias...

Pinga pinga indiferentemente
a água de prata
do chuveiro do Céu.
Das árvores encolhidas pelo frio
escorrem pela capa verde
pérolas líquidas
que tombam indolentemente ...
E na vidraça fina
a teia dágua surge,
engrossa
e cresce de repente ...
"Chove ..." - MOZART FIRMEZA. In O ADVENTO DO MODERNISMO
NA POESIA CEARENSE. AZEVEDO, Sânzio de
LITERATURA CEARENSE II - Marcelo Magalhães

Marcelo Magalhães disse...

Muito bom, Joana!
que mais possa pinga o chuveiro do Céu! inda que indiferentemente