22.5.13

o vigoroso painel poético de Gerardo Mello Mourão

Gerardo Mello Mourão é, entre os poetas cearenses do século XX, certamente o mais renomado Brasil afora e até mesmo no exterior. Carlos Drummond de Andrade declarou-se "possuído de violenta admiração pelo imenso, dramático e vigoroso painel" de Gerardo, poeta nascido em Ipueiras no dia 8 de janeiro de 1917. Ezra Pound, poeta norteamericano fundamental para a poesia contemporânea, elogiou a trilogia Os Peãs, iniciada pelo livro O País dos Mourões. Em 1998, Gerardo foi agraciado com o Prêmio Jabuti por sua epopeia A Invenção do Mar, considerado pelo crítico Wilson Martins como Os Lusíadas brasileiro. Leia abaixo um poema do bardo cearense, que morreu em 2007.












O QUE AS SEREIAS DIZIAM A ULISSES NA NOITE DO MAR

Sobre a frase musical de Ivar Frounberg
"Was sagen die Sirenen als Odysseus vorbei segelte"

Ninguém jamais ouviu um canto igual
ao canto que te canto
escuta: as ondas e os ventos se calaram e a noite e o mar
só ouvem minha voz — a noite e o mar e tu
marinheiro do mar de rosas verdes:

virás: é um leito de rosas e lençóis de jasmim — e ao ritmo
do teu corpo entre a cintura e as ancas
mais o lençol de aromas de meu corpo
em monte de pétalas desfeito:

e dormirás comigo
e os que dormem com  deusas
                   deuses serão — verás
cada arco de minhas curvas
à forma de teu corpo moldaremos — e a pele tua
aprenderá da minha
aroma e maciez e música
e entre garganta e nuca aprenderás
a noite dos que dormem a aurora dos que acordam
sobre os seios das deusas também deuses.

Vem dormir comigo
                  e comigo
e todas as sereias.

Todas as deusas se entregam
ao amante que um dia possuiu uma deusa
e então todas as fêmeas dos homens
Helenas, Briseidas e a Penélope tua
hão de implorar às Musas — e as Musas a Eros e Afrodite
a volúpia de uma noite contigo.

Não partas!
                                se partires
as velas de tua nau serão escassas
para enxugar-te as lágrimas — e nunca
nunca mais tocarás a pele das deusas
nunca mais a virilha das fêmeas dos homens
e nunca mais serás um deus

e nunca mais a melodia de uma canção de amor 
dos hinos do himeneu:
abelhas mortas para sempre irão morar
na pedra do jazigo de cera
de teus ouvidos cegos.

Mas vem
e vem dormir comigo
                  e comigo
                  e minhas irmãs e todas
                  as sereias do mar
                  as sereias da terra
                  e as sereias dos céus.


(Rio de Janeiro, 1998)



[o poema e as informações transcritas acima foram retiradas de http://www.germinaliteratura.com.br/literatura_fev2007_josevieirademelo.htm]

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