9.6.13

A Antropofagia de Oswald de Andrade, segundo Eduardo Viveiros de Castro


          "Viver é pensar: isso vale para todos os viventes, sejam eles amebas, árvores, tigres ou filósofos. Mas não é isso, justamente, o que pensam (e vivem) os povos com quem vivemos e sobre os quais pensamos? Não é isso, afinal, o que afirma o perspectivismo ameríndio, a saber, que todo vivente é um pensante? Se Descartes nos ensinou, a nós modernos, a dizer 'eu penso, logo existo' -- a dizer, portanto, que a única vida ou existência que consigo pensar como indubitável é a minha própria --, o perspectivismo ameríndio começa pela afirmação duplamente inversa: 'o outro existe, logo pensa'. E se esse que existe é outro, então seu pensamento é necessariamente outro que o meu. Quem sabe até deva concluir que, se penso, então também sou um outro. Pois só o outro pensa, só é interessante o pensamento enquanto potência de alteridade. O que seria uma boa definição da antropologia. E também uma boa definição da antropofagia, no sentido que este termo recebeu em certo alto momento do pensamento brasileiro, aquele representado pela genial e enigmática figura de Oswald de Andrade: 'Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago." Lei do antropólogo."

(Castro, Eduardo Viveiros de. "O perspectivismo é a retomada da antropofagia oswaldiana em novos termos". Entrevista a Luísa Elvira Belaunde. In: Sztutman, Renato (Org.). Eduardo Viveiros de Castro. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2008, pp. 117-8)

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