25.9.13

Doses de Caminha


Não, não são doses de caninha, ainda não. É do Adolfo que falo, o das Cartas literárias (1895), o Adolfo Caminha, renomado por seus romances de maior sucesso nacional, A normalista e Bom-Crioulo. Escritor combativo e rancoroso, em boa parte de sua produção se pode perceber o intuito de atacar, de posicionar-se contra um inimigo visado no momento. Em A normalista, era contra a burguesia fortalezense que Caminha se arma; no Bom-Crioulo, o ataque franco se dirige à Marinha do Brasil. E nas Cartas literárias, que reúnem artigos críticos do escritor cearense, não deixaremos de encontrar o mesmo espírito combativo, por vezes se arriscando na avaliação da literatura que lhe era contemporânea, o que carrega o perigo iminente da parcialidade
e do julgamento apressado.
Mas queria aqui era reproduzir trechos das Cartas literárias que tragam doses sumárias dessa percepção crítica de Caminha diante de escritores importantes para a literatura brasileira do final do século XIX. E a primeira dose representa a ressalva que Caminha sustentava diante do simbolismo,
narrando-nos um suposto diálogo, saboroso em seus termos. Vamos ao trecho:



       Há dias ouvi de um bardo conhecido os seguintes conceitos que me ficaram
a martelar o cérebro com uma insistência medonha. Dizia convictamente o ilustre nefelibata: -- Zola é um escritor como qualquer outro; nunca o li, mas tenho certeza de que não é um artista. Eu não trocaria um só dos meus versos por toda a obra dele.
       -- Não diga semelhante cousa!...
       -- Por que não hei de dizer, se, no meu entender, todo artista deve ignorar a ciência, limitando-se única e exclusivamente a dizer o que sente e o que pensa, sem consultar ninguém?
       E acrescentou:
       -- Eu, por mim, não invejo a sabedoria dos que estudam. Tenho talento, admiro o belo na natureza, e isto me basta para ser um artista superior...
       Mais um simbolista, gaguejei com os meus botões, e fiquei a pensar nas palavras do poeta.
(Caminha, Adolfo. Cartas literárias. Fortaleza: UFC, 1999, p.21-2)


Sente-se o travo maldoso nas palavras de Caminhas, mas... fiquei pensando se inda hoje não encontramos por aí poetas como o nefelibata acima. Peut-être...
Mais doses de Caminha serão servidas adiante. À nossa saúde!

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