4.12.12

Introdução à Poesia Parnasiana no Brasil

Os quatro poemas que seguem representam quatro possíveis entradas no espaço da vida literária brasileira em que o Parnasianismo teve proeminência. O sensualismo de Luís Delfino, a reflexão filosofante de Machado de Assis, a iconoclastia antirromântica de Carvalho Júnior e a poesia "socialista" de Valentim Magalhães servem de ganchos para a reflexão sobre a poesia parnasiana brasileira. Nem todos são conformes com a estética do Parnasianismo, mas servem todos para a configuração mais abrangente do período. Para conhecer um pouco dos antecedentes imediatos do nosso momento parnasiano, vale conferir o artigo crítico de Machado de Assis intitulado "A Nova Geração", de 1879, em que alguns dos poetas representados pelos poemas que seguem estão relacionados. O artigo crítico referido, como outros de Machado de Assis, podem ser acessados em http://machado.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=170:critica&catid=34:obra-completa&Itemid=123. Boa leitura.







Num turbilhão de estátuas
At the mind hour of night, when stars are weeping…
T. Moore – Irish melodies


Quando os formosos mármores de Atenas,
Brancos, como luares transparentes
Desmanchando seu feixe de açucenas
Na limpidez sonora das correntes,

Murmuram suas doces cantilenas
Pelas suaves curvas esplendentes,
Mas como um sonho, um vago sonho apenas,
Que embala a noite em páramos silentes...

Numa ebriez de luz, turbado e incerto,
Entre o alarido de rosais desperto,
Via erguer-se, surgir... Ficar só tu.

Do turbilhão de estátuas fugidias
Restavam só as formas luzidias
De teu corpo orgulhosamente nu.



(Luís Delfino, Algas e Musgos, 1927)








Círculo Vicioso


Bailando no ar, gemia inquieto vaga-lume:
 “Quem me dera que fosse aquela loura estrela,
Que arde no eterno azul, como uma eterna vela!”
Mas a estrela, fitando a lua, com ciúme:

 “Pudesse eu copiar o transparente lume,
Que, da grega coluna à gótica janela,
Contemplou, suspirosa, a fronte amada e bela!”
Mas a lua, fitando o sol, com azedume:

 “Mísera! Tivesse eu aquela enorme, aquela
Claridade imortal, que toda a luz resume!”
Mas o sol, inclinando a rútila capela:

 “Pesa-me esta brilhante auréola de nume...
Enfara-me esta azul e desmedida umbela...
Por que não nasci eu um simples vaga-lume?”



(Machado de Assis, Ocidentais, 1880)








Profissão de Fé


Odeio as virgens pálidas, cloróticas,
Beleza de missal que o romantismo
Hidrófobo apregoa em peças góticas,
Escritas nuns acessos de histerismo.

Sofismas de mulher, ilusões óticas,
Raquíticos abortos de lirismo,
Sonhos de carne, compleições exóticas,
Desfazem-se perante o realismo.

Não servem-me esses vagos ideais
Da fina transparência dos cristais,
Almas de santa e corpo de alfenim.

Prefiro a exuberância dos contornos,
As belezas da forma, seus adornos,
A saúde, a matéria, a vida enfim
.


(Carvalho Júnior, Parisina, 1879)








A Ideia Nova
A Barros Cassal


Abisma o teu olhar no azul do firmamento;
Devassa o velho Olimpo e o velho céu cristão:
À serena altivez do seu deslumbramento
A indagadora vista elevarás em vão!

Está deserto o céu! No grande isolamento
Palpita, ensanguentado, o sol – um coração.
Mas os deuses de Homero, o Jeová sangrento,
Alá e Jesus Cristo, os deuses onde estão?

Morreram. Era tempo. Agora encara a terra:
Ressoa alegre a forja e sai da escola um hino.
O Gênio enterra o Mal em uma negra cova.

Deus habita a consciência. O coração descerra
Aos ósculos do Bem o cálix purpurino.
Vem perto a Liberdade.
     É isto a Ideia Nova.


(Valentim Magalhães, Cantos e Lutas, 1879)



2 comentários:

eu precisava registrar disse...

Algumas pessoas na sala questionaram o fato da estrela desejar a lua e não sol.Porém, o impacto do poema é o enfado do sol (o astro rei)e a sua referência existencial ao vaga-lume, o tal inseto que começa esse processo e que parece ser tão ínfimo contrastando com os astros. Quer dizer, o efeito do poema só ocorre porque houve um sentido escalar que foi quebrado.

Marcelo Magalhães disse...

isso isso issso.. a cadeia se faz gradativamente, vaga-lume na estrela, estrela na lua, lua no sol, e sol no... vaga-lume, o que acaba por fechar o tal círculo vicioso..