26.2.11

atitude de apaixonada escuta



Manuel Bandeira, em seu Itinerário de Pasásrgada – que revela muito do "itinerário em poesia" do seu autor –, conta como foi se aproximando da "ideia de que a poesia está em tudo – tanto nos amores como nos chinelos, tanto nas coisas lógicas como nas disparatadas". Logo nas primeiras páginas do Itinerário, Bandeira fala dos primeiros versos que teria percebido, dos contos da carochinha, da companhia paterna. E do pai aliás ouviu Bandeira uns versos que o impressionaram, versos que seu pai por sua vez ouvira de um homem que lhe viera pedir esmola. Seu Souza Bandeira, o pai do poeta, brincara com o sujeito: "Pois não! Mas você antes tem de me dizer uns versos." E o sujeito assim se saiu:








Tive uma choça, ardeu-se.


Tinha um só dente, caiu.


Tive uma arara, morreu.


Um papagaio, fugiu.


Dois tostões tinha de meu:




Tentou-me o diabo, joguei-os.


E fiquei sem ter mais meios


De sustentar os meus brios.


Tinha uns chinelos... Vendi-os.


Tinha uns amores... Deixei-os.





Como diz o poeta de Pasárgada, "décima lapidar, cujo primeiro verso, estropiado, mostra que a estrofe não é de sua autoria".



[a imagem acima é retirada de O Poeta do Castelo, curta-metragem de Joaquim Pedro de Andrade sobre o cotidiano e a poesia de Manuel Bandeira, que podem ser conferidos abaixo]




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