[...]
Às três horas
lancharam. Foi delicioso; tinham estendido um guardanapo sobre a cama; a louça
tinha a marca do Hotel Central; aquilo parecia a Luísa muito estróina, adorável
— e ria de sensualidade, fazendo tilintar os pedacinhos de gelo contra o vidro
do copo, cheio de champagne. Sentia
uma felicidade exuberante que transbordava em gritinhos, em beijos, em toda a
sorte de gestos buliçosos. Comia com gula; e eram adoráveis os seus braços nus
movendo-se por cima dos pratos.
Nunca achara
Basílio tão bonito; o quarto mesmo parecia-lhe muito conchegado para aquelas
intimidades da paixão; quase julgava possível viver ali, naquele cacifo, anos,
feliz com ele, num amor permanente, e lanches às três horas... Tinham as
pieguices clássicas; metiam-se bocadinhos na boca; ela ria com os seus
dentinhos brancos; bebiam pelo mesmo copo, devoravam-se de beijos, — e ele
quis-lhe ensinar então a verdadeira maneira de beber champagne. Talvez ela não soubesse!
— Como é? —
perguntou Luísa erguendo o copo.
— Não é com o
copo! Horror! Ninguém que se preza bebe champagne
por um copo. O copo é bom para o Colares...
Tomou um gole
de champagne e num beijo passou-o
para a boca dela. Luísa riu muito, achou “divino”; quis beber mais assim. Ia-se
fazendo vermelha, o olhar luzia-lhe.
Tinham tirado
os pratos da cama; e sentada à beira do leito, os seus pezinhos calçados numa
meia cor-de-rosa pendiam, agitavam-se, enquanto um pouco dobrada sobre si, os
cotovelos sobre o regaço, a cabecinha de lado, tinha em toda a sua pessoa a
graça lânguida de uma pomba fatigada.
Basílio
achava-a irresistível; quem diria que uma burguesinha podia ter tanto chic, tanta queda? Ajoelhou-se, tomou-lhe os pezinhos entre as mãos,
beijou-lhos; depois, dizendo muito mal das ligas “tão feias, com fechos de
metal”, beijou-lhe respeitosamente os joelhos; e então fez-lhe baixinho um
pedido. Ela corou, sorriu, dizia: não! não! — E quando saiu do seu delírio
tapou o rosto com as mãos, toda escarlate; murmurou repreensivamente:
— Oh,
Basílio!
Ele torcia o
bigode, muito satisfeito. Ensinara-lhe uma sensação nova; tinha-a na mão!
[...]
(Queirós, Eça de. O Primo Basílio. São Paulo: Abril Cultural, 1979; capítulo VII, p.
160)
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