Alcir Pécora fala sobre Antônio Vieira, o "imperador da língua portuguesa", como o qualifica Fernando Pessoa. Vieira não foi, como circula por certo senso comum na rede, um intelectual, pois a noção de intelectual surgiria muito depois do século do Barroco, o XVII, somente no final do século XIX. Vieira foi combativo padre da Companhia de Jesus e se envolveu, como indica Pécora, em todas as grandes questões políticas, ideológicas, religiosas e mesmo econômicas, refletindo sempre agudamente sobre essas questões. Vale como interessante introdução à leitura dos sermões de Padre Antônio Vieira.
anotações sobre literatura, notas de aula, reflexos da cultura e a prática culta da vida
30.9.14
29.9.14
Barroco de Belém
Não sou fotógrafo razoável, mas eis que algumas imagens escapam como válidas da viagem a Belém. Cidade viva, rica e surpreendente, na qual se não houvesse nada que encantasse a vista já teria muito para encantar o espírito, que são suas imensas águas. As imagens que seguem tentam apresentar um pedaço mínimo da beleza das igrejas da cidade e de suas feiras coloridas. Para mais, só indo a Belém.
19.9.14
As variedades de Proteu
Procurando imagens de Proteu, entidade mitológica dos mares, encontrei algumas coisas interessantes. Uma delas é As variedades de Proteu, ópera editada em 1737, com libreto de António José da Silva e música de António Teixeira. António José da Silva é talvez mais conhecido pelo epíteto de o Judeu, condição que aliás o levaria a ser assassinado (!) pela Inquisição em 1739, com apenas 34 anos. A ópera do Judeu é ainda um tanto barroca, ainda que tenha sido escrita em plena efervescência neoclássica. Minha busca por Proteu relacionava-se a Bento Teixeira e sua Prosopopeia, poema em que o filho de Poséidon e de Tétis narra os grandes feitos de Jorge d'Albuquerque Coelho. Ao lado uma gravura que ilustrava o libreto da ópera As variedades de Proteu, e abaixo o link para uma pequena amostra da música composta para ela.
http://www.youtube.com/watch?v=8peKNzW70FU
16.9.14
5 sonetos de Gregório de Matos
Pequei, Senhor, mas não
porque hei pecado,
Da vossa piedade me despido,
Porque quanto mais tenho delinquido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.
Se basta a vos irar tanto um pecado,
A abrandar-nos sobeja um só gemido,
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
Se uma ovelha perdida, e já cobrada
Glória tal, e prazer tão repentino
vos deu, como afirmais na Sacra História:
Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada
Cobrai-a, e não queirais, Pastor divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.
Da vossa piedade me despido,
Porque quanto mais tenho delinquido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.
Se basta a vos irar tanto um pecado,
A abrandar-nos sobeja um só gemido,
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
Se uma ovelha perdida, e já cobrada
Glória tal, e prazer tão repentino
vos deu, como afirmais na Sacra História:
Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada
Cobrai-a, e não queirais, Pastor divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.
O alegre do dia
entristecido,
O silêncio da noite perturbado
O resplendor do sol todo eclipsado,
E o luzente da lua desmentido!
Rompa todo o criado em um gemido,
Que é de ti mundo? onde tens parado?
O silêncio da noite perturbado
O resplendor do sol todo eclipsado,
E o luzente da lua desmentido!
Rompa todo o criado em um gemido,
Que é de ti mundo? onde tens parado?
Se tudo neste instante está acabado,
Tanto importa o não ser, como haver sido.
Soa a trombeta da maior altura,
A que a vivos, e mortos traz o aviso
Da desventura de uns, d'outros ventura.
Acabe o mundo, porque é já preciso,
Erga-se o morto, deixe a sepultura,
Porque é chegado o dia do juízo.
Triste Bahia! Oh quão
dessemelhante
Estás, e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado,
Rica te vejo eu já, tu a mi abundante.
A ti tocou-te a máquina mercante,
Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando, e tem trocado
Tanto negócio, e tanto negociante.
Deste em dar tanto açúcar excelente
Pelas drogas inúteis, que abelhuda
Simples aceitas do sagaz Brichote.
Oh se quisera Deus, que de repente
Um dia amanheceras tão sisuda
Que fora de algodão o teu capote!
Estás, e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado,
Rica te vejo eu já, tu a mi abundante.
A ti tocou-te a máquina mercante,
Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando, e tem trocado
Tanto negócio, e tanto negociante.
Deste em dar tanto açúcar excelente
Pelas drogas inúteis, que abelhuda
Simples aceitas do sagaz Brichote.
Oh se quisera Deus, que de repente
Um dia amanheceras tão sisuda
Que fora de algodão o teu capote!
Não vi em minha vida a
formosura,
Ouvia falar nela cada dia,
E ouvida me incitava, e me movia
A querer ver tão bela arquitetura.
Ontem a vi por minha desventura
Na cara, no bom ar, na galhardia
De uma Mulher, que em Anjo se mentia,
De um Sol, que se trajava em criatura.
Me matem (disse então vendo abrasar-me)
Se esta a cousa não é, que encarecer-me.
Sabia o mundo, e tanto exagerar-me.
Olhos meus (disse então por defender-me)
Se a beleza hei de ver para matar-me,
Antes, olhos, cegueis, do que eu perder-me.
Ouvia falar nela cada dia,
E ouvida me incitava, e me movia
A querer ver tão bela arquitetura.
Ontem a vi por minha desventura
Na cara, no bom ar, na galhardia
De uma Mulher, que em Anjo se mentia,
De um Sol, que se trajava em criatura.
Me matem (disse então vendo abrasar-me)
Se esta a cousa não é, que encarecer-me.
Sabia o mundo, e tanto exagerar-me.
Olhos meus (disse então por defender-me)
Se a beleza hei de ver para matar-me,
Antes, olhos, cegueis, do que eu perder-me.
Rosa, que da manhã lisonjeada,
Púrpuras mil, com ambição dourada,
Airosa rompe, arrasta presumida.
É planta, que de abril favorecida,
Por mares de soberba desatada,
Florida galeota empavesada,
Sulca ufana, navega destemida.
É nau enfim, que em breve ligeireza,
Com presunção de Fênix generosa,
Galhardias apresta, alentos preza:
Mas ser planta, ser rosa, nau vistosa
De que importa, se aguarda sem defesa
Penha a nau, ferro a planta, tarde a rosa?
15.9.14
14.9.14
Para ler a poesia engenhosa de Botelho de Oliveira
Para conhecer melhor a poesia de Música do Parnaso (1705) e os fundamentos de À Ilha da Maré, composições poéticas do baiano Manuel Botelho de Oliveira (1636-1711), pode consultar alguns estudos de Ivan Teixeira, autor de Mecenato Pombalino e Poesia Neoclássica (Edusp, 1999), estudo amplo sobre a produção poética do neoclassicismo no Brasil. Seguem os links para acesso a três textos de extensão variada, sendo o primeiro deles uma pequena nota de jornal apresentando o poeta Botelho de Oliveira e o último um artigo sobre À Ilha da Maré. O segundo estudo é um ensaio mais detalhado sobre a poesia de
Música do Parnaso.
Música do Parnaso.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs1908200121.htm
http://www.revistas.usp.br/revusp/article/viewFile/35284/38004
http://www.academia.org.br/abl/media/Revista%20Brasileira%2072%20-%20PROSA.pdf
6.9.14
Histórias do Brasil 3: Guerra pelo Açúcar
Eis o terceiro documentário da série "Histórias do Brasil", produzida pela Rede Brasil. A pequena narrativa que serve de ilustração ao período estudado se passa em Pernambuco, 1645. Trata-se portanto de período em que a riqueza propiciada pelo açúcar grassava, o panorama político europeu se complicava (Portugal chegando, por exemplo, a perder sua autonomia política em 1580) e a vida cultural na grande colônia portuguesa na América começava a existir de modo palpável (ainda que este aspecto não se evidencie no documentário). Vale conferir.
5.9.14
O êxtase de Santa Teresa, de Bernini
Documentário sobre Gian Lorenzo Bernini (1598-1680), artista fundamental do barroco italiano, da série "O poder da arte", produzida pela BBC. Belo documentário, que conta um pouco da vida agitada de Bernini, detendo-se com olhar atento nas formas sensualíssimas das esculturas do artista italiano.
1.9.14
Caracterizando a narrativa naturalista
A
série de seis volumes de A Literatura no
Brasil, coordenada por Afrânio e Eduardo Coutinho, tem seu quarto
volume dedicado ao que nele é chamado de
"Era realista" e "Era de transição". No capítulo inicial
deste volume 4, é o próprio Afrânio Coutinho quem delineia um painel vasto da
chamada "Era realista", tratando conjuntamente do Realismo, do
Naturalismo e do Parnasianismo no Brasil. Importará aqui destacarmos dois parágrafos
que procuram distinguir a narrativa realista da naturalista. O primeiro
parágrafo destacado é o seguinte:
"Há, pois, diferenças
fundamentais entre os dois [o escritor realista e o naturalista], como mostra
ainda Hibbard: 1) A visão da vida do Naturalismo é mais determinista, mais
mecanicista: o homem é um animal, presa de forças fatais e superiores sem
efeito e impulsionado pela fisiologia em igualdade de proporções pelo espírito
ou pela razão; 2) O naturalista observa o homem por meio do método científico,
impessoal e objetivamente, como um 'caso' a ser analisado; 3) O naturalista
denota inclinação reformadora: a sua preocupação com os aspectos da
inferioridade visam à melhoria das condições sociais que a geraram; 4) O
naturalista, com sua preocupação científica, declara-se de interesses amplos e
universais, nada é desprovido de importância e significado como assunto, nada
que esteja na natureza é indigno da literatura. Essa universalidade e
fidelidade ao fato, a todos os fatos, conduz o Naturalismo a certo amoralismo,
certa indiferença. Não importa a opinião sobre os atos, mas os atos em si
mesmos" (Coutinho, 2004, p.
12).
E,
arrematando a caracterização da prosa naturalista, Coutinho assim a define:
"O Naturalismo acentua as
qualidades do Realismo, acrescentado uma concepção da vida que a vê como o
intercurso de forças mecânicas sobre os indivíduos, resultando os atos, o
caráter e o destino destes da atuação da hereditariedade e do ambiente. O
espírito de objetividade e imparcialidade científicas faz com que o naturalista
introduza na literatura todos os assuntos e atividades do homem, inclusive os
aspectos bestiais e repulsivos da vida, dando preferência às camadas mais
baixas da sociedade. Pelo método documental, pelo uso da linguagem simples,
direta, natural, coloquial, mesmo vulgar, e dos dialetos das ciências e
profissões, o Naturalismo procura representar toda a natureza, a vida que está
próxima da natureza, o homem natural" (idem, p. 13).
Restaria
perguntar, nos tempos de hoje — desde Baudelaire, pelo menos —, o que seria um
"homem natural"...
Referências
bibliográficas:
Coutinho, Afrânio (Org.). A Literatura no Brasil, vol. 4. São
Paulo: Global, 2004
Baudelaire, Charles. O pintor da vida moderna. São Paulo: Autêntica, 2010.
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